sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Tudo o que é vivo, morre

Este mês uma amiga morreu. Foi a experiência de perda mais próxima que enfrentei em minha vida.

Nunca perdi alguém tão próximo. Diferente da minha esposa, que desde cedo sabe o que é perder as pessoas que ama. Seu pai morreu quando ela era criança e esta lembrança ainda vagueia à sua volta. Ela ainda perdeu amigos e avós durante toda sua vida. Ela se apega às pessoas e vive como se amanhã elas fossem morrer.

Eu, diferente, não me apego às pessoas. Não que não dê amor, mas a falta da experiência da morte me fez totalmente perene diante da sua certa, triste e violenta realidade.

Até certa indiferença me marcava. Dureza e pragmatismo. Eu era muito seco.

Até a morte desta amiga.

A morte é uma ruptura na trama natural da vida. Mas uma ruptura tão natural quanto a trama toda à sua volta. Não há nada de sobrenatural na morte, mas ao contrário, há uma constatação de que a natureza segue seu curso eternamente, pois, como já diria Chicó, personagem do Auto da Compadecida, tudo o que é vivo, morre.

Inexorável esta força da natureza. O curso do rio da vida nos mostra que não estamos livres, nenhum de nós, da fatídica hora de encarar o fim. Porém, quantas vezes fingimos que este fim não chegará?

Pensamo-nos imortais, eternos. Imaginamos que podemos fazer o que for e não seremos atingidos. Vemos-nos como grandes guerreiros vencedores de todas as batalhas.

Porém, e se Deus resolver abreviar nossos dias? Como vou olhar, por exemplo, para a imagem do meu pai ou da minha mãe dentro de um caixão forrado de flores?

E eu? Até quando durarei? Há alguns meses venho sentindo umas pontadas no coração. Aos 28 anos isto é mais perigoso, pois o impacto é mais violento, do que aos 40. Conduzi minha vida longe da morte, evitando a dor e a tristeza. Será que terei de encará-la tão cedo?

Demonstrei até agora certa indiferença frente à dor da perda dos outros. Porém, isto se dá por causa da ausência da experiência. Eu julgava, em meu entendimento, que a dor não é tão grande a ponto de deixar as pessoas da forma como ficam e que a experiência da morte é distorcida pela cultura judaico-cristã, que demonstra, de forma errada, que é uma experiência de perda, terror e tristeza.

“Para mim, viver é Cristo e morrer é lucro”. É o que dizia o apóstolo Paulo quando lhe perguntavam se tinha medo de morrer. Ele sabia qual era sua missão e estava determinado a cumpri-la. Como diria Montesquieu, devemos chorar às pessoas quando nascem e não quando morrem. Nascer é expor-se a este mundo triste, enquanto morrer é encontrar a paz tão buscada em todas as nossas lutas.

O que escreverão em meu epitáfio? O que estaria sobre o meu esquife? Quantas coroas estariam à volta do meu caixão? Quantas mãos disputariam as suas alças? O que as pessoas diriam em minha derradeira despedida?

Pensei nisso enquanto carregava a alça do caixão da minha amiga. Não perdi muitas pessoas importantes. Esta foi uma das mais marcantes e tocantes despedidas de que me recordo. Não tive coragem de olhar seu caixão. Não gosto da cara que a morte nos dá. Cara de abandono e solidão. Não nos faz justiça.

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